domingo, 29 de julho de 2012

Porque amo Giuseppe Tommasi di Lampedusa



Porque amo Giuseppe Tommasi di Lampedusa

Comprei o livrinho O Leopardo (Il Gattopardo, no original), apenas porque mais ou menos havia iniciado a coleção dos volumes de um determinado ‘pacote’ de livros, que certa editora estava lançando mensalmente. Isto já faz uns 15 anos e até então desconhecia quem tinha sido Giuseppe T. di Lampedusa.
Uma lida no prefácio, escrito por Giorgio Bassani, o  cara que levou o livro a ser publicado, lá na Itália, me deixou curiosa, pois ele  se referia à obra como  a um achado raro.  Li o livrinho e me apaixonei por Lampedusa.  O enredo não tem nada demais: seria uma rememoração da vida do avô do autor, o príncipe Giulio Fabrizio di Salinas, que viveu intensamente o episódio da unificação do Estado italiano, fato ocorrido a partir da segunda década do século XIX.

Ocorre que a gente percebe o entrelaçamento existente entre o personagem do livro e o próprio autor, como se este tivesse desejado mostrar simultaneamente o avô e a si mesmo. Além disso, há a descrição da vida da nobreza  italiana da época (Fabrizio di  Salinas, como Giuseppe Tomasi – posteriormente - foram ambos príncipes de Lampedusa, uma ilha pertencente à Sicília). E a descrição da vida da família do príncipe é muito interessante.  
A estória depois foi filmada (em 1963), por Luchino Visconti, com os atores Burt Lancaster, Alain Delon e Claudia Cardinale, e o filme consagrou-se como uma obra prima. Mas, voltando ao livro, a estória nos encanta pela descrição da vida da alta aristocracia italiana, como mencionei. Mas também nos prende devido ao tema, pois relata a decadência da classe dominante, que estava sendo então destronada pela burguesia nascente. Percebe-se, ainda que muitas vezes sutilmente, o estado melancólico do príncipe, que julga a sua classe e família já vencidas e suplantadas pela classe ascendente.

Quando toma conhecimento de que o seu amado sobrinho Tancredi de Falconeri vai se aliar à nova classe, contra a aristocracia (contra a própria família, portanto), o príncipe fica perplexo.
Questionando as razões do “disparate” ao sobrinho, este, com agudeza de espírito, explica:

“é preciso que tudo mude, para que permaneça como sempre foi”.

O príncipe então passa a apoiar o sobrinho, inclusive quanto à coligação que este faz com a  classe ascendente, ao casar-se com a filha de um dos seus expoentes (o velhaco, porém perspicaz e novo rico, Don Calogero Sedàra). A ironia é que a filha do príncipe, a jovem Concetta, sempre amou o primo Tancredi, com quem acreditava que viria a casar-se.  Então temos um livro que nos oferece um tema histórico; reflexões sociais e políticas; interessantíssimas descrições sobre a vida aristocrática;  conflitos de valores e muito mais.
Todavia, o que me arrebatou, mais do que tudo, foi o amor do príncipe Salinas pelos cães. E o fato de ele atribuir aos sicilianos de então uma índole violenta, ignorante e, de certo modo, criminosa,  o que nos faz antever o espírito que geraria a máfia. Não obstante tudo isso, é perceptível o amor do príncipe pela Sicília.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Cinema Especial - O Clube da Luta!


Atenção, Spoiler, texto com revelações sobre o enredo do filme acima!

 
O Clube da Luta

Um dia desses revi um pedaço do filme “O Clube da Luta”, que estava sendo exibido na TV. Geralmente só me ponho em frente à TV , durante o dia (era o fim do dia, a bem da verdade), quando vou fazer algum trabalho manual, que não requeira muita atenção, como era o caso. O fato é que eu não posso ver cenas desse filme -  que vi pela primeira vez na época do lançamento, lá pelos idos do ano 2000 -,  sem me deter  para assisti-las, pois o considero uma obra genial.
O filme conta a estória de um personagem cujo nome não é dito (pelo menos eu não me lembro de alguém ter nomeado o cara, ou ele mesmo ter se apresentado com um nome). Que é um homem comum, inserido no contexto da sociedade contemporânea. Por alguma razão este homem (interpretado pelo ator Edward Norton)  viaja muito a serviço – ele trabalha numa companhia que vende automóveis - e está passando por um período em que sofre continuadamente de insônia.

Numa das viagens áreas, ele conhece um homem chamado Tyler Dunder (interpretado por Brad Pitt), com quem entabula uma conversa e estabelece uma estranha relação.  Tyler Dunder parece ser tudo que o primeiro homem não é: inteligente, questionador, transgressor e totalmente disposto a mudar a “perversa” ordem das coisas; um cara de ação.   De ação e de palavras, pois as frases que Tyler Dunder profere são bombásticas, do tipo que leva as pessoas a refletirem e  - estranhamente - a concordarem com elas. Ele diz, por exemplo:

“Somos uma geração sem peso na história. Sem propósito ou lugar. Nós não temos uma Guerra Mundial. Nós não temos uma Grande Depressão. Nossa Guerra é a espiritual. Nossa depressão são nossas vidas.   Fomos criados através daTV para acreditar que um dia seríamos milionários, estrelas do cinema ou astros do rock. Mas não somos."

Eu vejo aqui as pessoas mais fortes e inteligentes. Vejo todo esse potencial desperdiçado.
A propaganda põe a gente pra correr atrás de carros e roupas. Trabalhar em empregos que odiamos para comprar merdas inúteis”
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“Você não é o seu emprego. Nem quanto ganha ou quanto dinheiro tem no banco. Nem o carro que dirige. Nem o que tem dentro da sua carteira. Nem a porra do uniforme que veste. Você é a merda ambulante do Mundo que faz tudo pra chamar a atenção”.

Mas essas coisas (e muitas outras!) ele diz ao vendedor de automóveis durante o filme inteiro, no início ele apenas intriga e instiga o homem,  a quem vai enredando em seu mundo. O vendedor insone não consegue que o médico lhe receite remédios para dormir, que em vez disso, o aconselha a aderir a reuniões de grupos de apoio, para que possa ver o que são problemas reais, para assim superar o seu problema de fantasia.

O vendedor então passa a frequentar as reuniões de um grupo de vítimas de câncer nos testículos e se torna, a partir de então, viciado em reuniões de grupos de apoio, que passa a frequentar obsessivamente. Numa dessas reuniões ele percebe a presença de  uma mulher, Marla Singer (interpretada por Helena Boham Carter) que também frequenta as tais reuniões, sem ser uma vítima dos problemas discutidos. A mulher é meio marginalizada e libertina, e o vendedor não demonstra simpatia por ela, tanto que consegue que ela concorde em  não frequentar os mesmos grupos que ele frequenta.

Nesse meio tempo o vendedor tem o apartamento explodido, em sua ausência, e é levado, por Tyler Dunder,  a fundar um clube de lutas, no subsolo de um prédio. O clube recebe muitas adesões e os homens que entram nele lutam para valer, como se estivessem participando de um desses campeonatos de luta livre, que a gente assiste na TV. Em seguida eles se tornam como que um grupo de subversivos, que toma para si a missão de dar um jeito no mundo, o que significa, executar muitas ações de caráter terrorista, como fazem as facções terroristas existentes no mundo.  
 Aí Marla Singer telefona ao vendedor  comunicando que tomou um punhado de pílulas e está sofrendo os efeitos da overdose, coisa que ele resolve ignorar. Todavia, Dunder fica sabendo do ocorrido e vai socorrer a mulher, com quem passa a ter um ativo relacionamento sexual. Dunder continua a ser a mente e o motor de tudo o que ocorre na nova vida do vendedor, que ganha um cunho totalmente diferente do que era antes. A nova vida é cheia de ações contra o sistema, todas violentas ou abusivas, como a inserção de imagens pornográficas em filmes infantis, ato perpetrado por Dunder, que se emprega como projecionista de cinema exclusivamente com este objetivo.
  
As ações vão se sucedendo, cada vez mais provocativas e/ou arrasadoras  e o vendedor começa a achar que Dunder talvez tenha ido longe demais. E é aí que ele descobre que ... Dunder na verdade é  ... ele próprio! Sim, lá atrás, no início do período de insônia, ele entrou em processo de esquizofrenia! E se Dunder é ele mesmo, toda a destruição perpetrada até ali, inclusive a explosão do proprio apartamento, foi ação executada por ele mesmo! Tudo isso é dito abertamente, em "conversas" que ele tem com Dunder, e através das cenas mostradas em flasbacks, mas muita gente chega ao fim do filme sem perceber que o vendedor e Dunder são a mesma pessoa!
  
E tem mais, nas cenas finais é vista a explosão das torres gêmeas do World Trade Center (sim, por favor, alguém aí assista é me diga se é ou não, pois já me disseram aqui que são apenas prédios parecidos!). As torres ruem como parte dos planos de destruição arquitetados pelo “grupo” de Dunder, que a gente começa a ver como outras personalidades criadas pela doença que acomete o vendedor.  O detalhe é que o filme foi lançado em 1999 e o atentado ao W TC ocorreu em 2001, como todos aí devem se lembrar!